Demorei
três anos para sair da estaca zero no inglês até o nível de conversar com
nativos sem ser reconhecida como estrangeira
Quando foi a última vez que você se desafiou a fazer algo foda?
Sabe aquela pessoa que canta Oasis na rodinha de violão, assiste filme sem legenda e
encontra qualquer informação que precisa nos sites gringos? Eu não fui essa
pessoa por quase três décadas da minha vida. Mas foi necessário muito
menos tempo do que eu imaginava para me torná-la. 2018 tá aí na porta e, se o
seu monolinguismo tá te incomodando, que tal você se desafiar a aprender uma
língua?
Existe a
crença de que apenas quando se começa na infância ou na adolescência é que
podemos ser fluentes num idioma. No
livro Becoming Fluent: How Cognitive Science Can Help
Adults Learn a Foreign Language,
Richard Roberts e Roger Kreuz mostram como essa ideia é furada. Os autores falam de estudos que
apontam que, de fato, quanto mais jovem você começa a falar uma língua, maiores
as chances de você ter uma boa pronúncia. Mas a fluência de alguém que começou
a aprender uma língua quando adulto em geral se aproxima muito ou pode até ser
idêntica a de alguém que fala desde criança.
Na verdade, segundo Roberts e Kreuz, existem até vantagens em se
aprender um idioma na idade adulta, como o fato de que você pode transferir os
conhecimentos linguísticos que tem da sua língua materna para a segunda. Por exemplo, é impossível
explicar para uma criança que na frase “Ellas son estudiantes” o verbo está no
plural pois concorda com o sujeito, simplesmente porque uma criança talvez não
entenda o que é um verbo, muito menos um sujeito e possivelmente nem mesmo o
conceito de plural. Essa é só uma das vantagens, tem mais.
Já vou avisando que, em um ano, não vai rolar de ser o poliglota bonitão
que você acabou de se imaginar aí, mas já dá pra se virar sozinho nas viagens,
entender umas músicas só de ouvido e até ver uns filminhos sem legenda. E o
mais importante: depois de ver os resultados de um ano, você não vai querer
parar. E aí sim essa estrada sem volta vai te levar ao efeito Jason Bourne: um
dia você atende um telefonema e... olha só, minha gente, nem lembrava, mas eu
falo outra língua! Como isso foi acontecer?!
Existem várias questões relacionadas a falar um outro idioma que podem
afetar muito a autoestima de uma pessoa. No meu caso, ficava bem sem graça por
já estar com vinte e tantos anos e não falar um inglês minimamente decente. E
essa frustração foi virando um medo de começar, já que eu achava que isso era
algo que deveria ter acontecido muito antes na minha vida. Na minha cabeça,
aprender uma língua enquanto trabalhava e cuidava das coisas práticas da vida
adulta seria impossível. Mas um dia eu precisei aprender por questão de
sobrevivência. E
adivinha? Dei conta.
O
processo foi foda, doloroso mesmo. O primeiro ano é puro esforço e pouca
recompensa. No segundo, eu comecei a ver mais os resultados do meu esforço. Do
terceiro em diante, comecei a colher os frutos mais significativos dessa
jornada. E olha, vou te dizer, dá um orgulho danado pensar que eu não desisti.
O que
muita gente ignora é que aprender uma língua não é só uma questão de acumular
conhecimentos. Existem fatores emocionais e psicológicos, além de estratégias
para otimizar o processo que eu gostaria que alguém tivesse me contado quando
eu estava começando. E é disso que a gente vai falar aqui.
1. Comece pelo básico
Uma das
dificuldades para se aprender uma língua depois de adulto é que já sabemos demais.
Já experimentamos muito da vida, dos sentimentos e das sensações e conhecemos
todo o potencial que a nossa língua materna tem para expressar tudo isso. O
problema é que criamos a expectativa de ter todo esse poder de expressão no
novo idioma, e o pior: imediatamente.
Eu sei,
quando você se imagina falando uma língua, você está tendo conversas profundas
sobre a humanidade, sendo o centro da rodinha e fazendo todo mundo rir e te
lançar olhares de aprovação, né? Mas não será assim por muito tempo. Então não
atropele seu processo de aprendizado, você não será o fodão dos phrasal
verbs se
ainda não aprendeu o to be. O primeiro ano de aprendizado de uma língua
não é divertido. É sofrimento, muito esforço e pouca recompensa. E isso nos
leva à próxima dica.
2. Tenha paciência e seja persistente
Uma das maiores dificuldades de se manter motivado
para aprender um idioma é que esse é um investimento de longo prazo. Nesse
caso, use a filosofia do “só mais um dia”. Só por hoje, tire um tempinho pra
estudar, mesmo sabendo que isso não vai fazer uma grande diferença imediata.
Também ajuda bastante criar uma forma de medir sua
evolução de alguma forma. Você pode, por exemplo, filmar uma aula ou
conversa sua naquela língua. Depois de 3 meses, assista o vídeo, grave outro e
assim sucessivamente. Ver que você está evoluindo vai te dar a motivação que
você vai precisar quando estiver cheio de ideias na cabeça e não conseguir
colocar nenhuma pra fora ao abrir a boca. Isso vai acontecer muitas vezes,
mesmo depois de muito estudo. Mas não pare.
3. Aceite seus
erros
Se você é perfeccionista, ou você aprende de vez a
aceitar sua imperfeição e entende que ela não te impede de realizar coisas ou
você enlouquece. Mas por favor, tente ficar com a primeira opção, ela será bem
mais útil. Entender que eu não precisava fazer frases gramaticalmente perfeitas
ou pronunciar tudo maravilhosamente bem para dar o meu recado foi das coisas
mais libertadoras na minha jornada linguística.
Caso tenha a oportunidade de conversar na sua nova
língua, não tenha medo de falar. Às vezes ficamos com medo do que vão pensar da
gente ali falando como uma criança de três anos. Em primeiro lugar, não se
esqueça de que falar uma língua estrangeira mal é melhor do que não falar
língua estrangeira nenhuma. Você já está em vantagem só de conhecer um pouco
daquele idioma. Mas se insegurança bater, lembre-se de que provavelmente a
pessoa com quem você está conversando não é tão importante assim pra você ou
você é que não é tão importante assim.
Ela vai seguir com a própria vida sem
nem lembrar dos seus erros. Além disso, se a ideia é impressionar alguém, não é
calado que você faz isso. Cara de pau impressiona também. Eu mesma costumo ser
extremamente crítica com meu inglês, mas todas as vezes que falei com nativos, escutei
deles que eu tinha uma fluência impressionante, mesmo sabendo que cometia uns
errinhos aqui e ali.
4. Ligue o foda-se
para seu sabotador interno
No início do processo de aprendizado de
uma língua, você precisa dar a cara a tapa e falar, o que te coloca na posição
desconfortável de parecer bobo, desajeitado, involuntariamente engraçado. E
essa sensação vai fazer você se sabotar. Você vai pensar em incontáveis razões
pra não ir à aula ou pra adiar aquela conversa pelo Skype. Não sucumba. Ao
terminar cada uma das conversas com nativos que o meu sabotador interno me dava
mil desculpas para não ter, eu me sentia foda, eu me dava um tapinha nas costas
e dizia: You did it!
5. Conhece-te a ti
mesmo
Descubra como você aprende. Eu, por exemplo, preciso
ler, não sou dessas que pega só de ouvir. Quando não entendo algo, preciso
descobrir a lógica por trás daquilo ou sistematizar aquele conhecimento de
alguma forma. Por exemplo, minha pedra no sapato era o present perfect. Depois que eu
estudei as regras e vi muitos exemplos para cada uma delas, eu finalmente
entendi. Claro que não penso nas regras enquanto estou numa conversa, mas
compreendê-las me permitiu internalizá-las e usar o present perfect sem maiores
dificuldades. Esse autoconhecimento só vem ao longo do processo de aprendizado,
depois de muita tentativa e erro. Então, claro, não espere por ele para
começar.